quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Para São Chico de Assis.


Eu gostaria de amar todos os animais da Terra e tratá-los bem - mas não. Depois eu quis respeitar todos, mas falhei novamente. Tentei suportá-los, pensando que não me faziam mal algum. Funcionou com formigas, moscas (apesar do "zum zum zum" no ouvido às 3 horas da manhã no verão) e até abelhas (que me intimidam porque a sua picada dói e arde prá caramba). Mas assumi, de coração limpo, que odeio cobras, ratos e baratas. Que São Francisco de Assis me perdoe.

Se alguém me perguntar porquê, darei n motivos. São traiçoeiros. São asquerosos. Exalam venenos perigosos (alguns mortais se não tratados a tempo). Transmitem doenças. Mas no fundo, BEM no fundo, é uma mistura louca e insana de medo e nojo. Deve ter alguma explicação no meu inconsciente individual, e uma outra no inconsciente coletivo. Fato que não consigo estar no mesmo ambiente que eles. Numa ordem de classificação, eu diria que odeio menos ratos e mais cobras. Baratas é aquele "meio termo", pois mata-se com mais facilidade e não oferecem riscos para a minha vida.

O problema é que percebi, ao longo do tempo, que quanto mais alimento estes medos do mundo animal, mas eles me perseguem.
Eu já convivi, por exatos 15 dias, com um ratão dentro de casa. Morávamos em seis meninas, e o rato era praticamente um sétimo morador. Na calada da noite ele fazia um puta banquete (preferia frutas, macarrão, doces e o queijo das ratoeiras), deixava uns resíduos sólidos por aí (mal-educado!) e sumia.
De manhã, haviam furos nos alimentos na despensa, frutas comidas na fruteira e a ratoeira vazia. Ele só não deixava um bilhete de "Valeu, Losers", porque não havia tintas à vista.
Uma noite, eu e a Andrea o pegamos, entrando no forno do fogão já velho. Sem hesitação, ligamos e assamos. Ok, sim, eu me senti mal depois. E desembolsamos uma grana para comprar um fogão novo.

Uns dois anos depois, na mesma casa, uma vizinha foi nos entregar uma correspondência errada que chegou na casa dela. Tocou a campainha, ouvimos um grito, e quando abrimos o portão, não havia ninguém. Ela mandou um recado, para todas nós, pelo Orkut (na época que o Orkut servia para isso, claro): "Meninas, fui na casa de vocês entregar a conta, mas havia um lagartão na caixa do Correio!!! Me assustei e fui embora!!! Cuidem disso!!! É perigoso!!!!".
Abrimos a caixa do correio, e lá estava o bonitón, refrescando-se do calor de 36 graus que assolava Campinas. Não preciso dizer que ninguém conseguiu tirar o desértico de lá, e ficamos um mês pegando a correspondência na vizinha até ele ir embora. Também passamos outros seis meses ouvindo que morávamos no Deserto do Interior, e que o carteiro cobrava uma taxa extra para nos entregar correspondência, devido ao alto nível de periculosidade daquela residência.

Não adianta. Estes medos de origem animal sempre acarretam algum prejuízo. Uns podem dizer que são bichos inofensivos, importantes na cadeia alimentar, que não me fariam mal algum (ao contrário, eu é que os assusto!); mas eu me rendo sempre a este problema primitivo de convivência.
Já joguei uma dúzia de panelas fora, porque achei um ninho de baratas no armário  onde estavam guardadas (para o diabo os que acreditam que o cloro resolve tudo!).
E, neste momento, sei que há uns três ratões na cozinha de casa (graças a uns cultivos ilegais do vizinho). Quero ver quem é que iria lá pegar um copo de água tranquilo, no escuro! Vai, santo!! Diz! Diz!

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Cruz e Souza, Jim e Sigmund.



Os poetas simbolistas já eram bem doidões, e acreditavam que era preciso dar vazão às manifestações do inconsciente. Não, eles não leram Freud (o que faz com que o Freud tenha dada várias acertadas na vida).

O simbolismo era uma grande loucura poética, que valorizava as nossas loucuras internas, transformando-as em algo acessível para o externo. Um pouco de LSD depois, e Jim Morrison teve uma ideia semelhante, quando criou o "The Doors", apoiado no livro de A. Huxley, "As portas da percepção", onde o autor acreditava haver uma porta que deveríamos abrir para entrar em contato com nossos instintos e percepções mais profundas. Uma suposta valorização dos sonhos, na sua máxima.

Eu, particularmente (além de simpatizar com algumas poesias simbolistas, com algumas músicas do Doors e com algumas ideias do Freud), acredito haver uns quatro tipos de sonhos.

Há aquele sonho "coletivo", que você quer contar para todo mundo, dar risada, compartilhar com os amigos e lembrá-lo depois sempre com um riso característico de fundo. Igual tortinha quente do Mc Donalds. Mesmo que você não goste, que saia da sua dieta, que você seja contra o Mc Donalds e o capitalismo selvagem, o cheirinho é bom e agrada todo mundo.

Há os sonhos "meio-coletivos", que você compartilha com amigos mais próximos, pois contém um pouco mais de informação (que óbvio, você não está tão afim de compartilhar assim), e você lembra depois com um pouco de desconfiança. Meio aquele suco bem gostoso do seu restaurante preferido, que você não sabe de onde vem as frutas, e tem medo de saber. "Assim tá bom".

Há os sonhos "não coletivos", que você compartilha com o(a) melhor amigo(a) e pronto. Não quer voltar a falar dele, tem conteúdos que você prefere esquecer, umas imagens tortas, umas cenas que "meu Deus". É íntimo demais. Tipo aquela sensação que você matou seu irmão, e "mesmo que ele seja o capeta encarnado, Deus disse que matar irmão é pecado". Você só conta para alguém para aliviar um pouco a culpa. Igual aquele cafézinho diário que você esconde do seu médico e piora sua gastrite.

E, por fim, há os sonhos "nem fudendo!". Você não conta pra ninguém ("nem fudendo!"), nem escreve sobre ("nem fudendo!"), e quer mais é que tudo passe logo e você durma tranquilo outra vez. Tem medo de que as pessoas olhem na sua cara e descubram o que você sonhou. Você acorda com vergonha, toma banho com vergonha, se troca com medo de sair às ruas, e tem a sensação de que todos saberão o que você fez na noite passada. É algo para se esquecer. Muito pior do que aquele filme ruim no cinema, aquele comida estragada, aquela noite em que você bebeu demais. Nada é pior que isto. "Ó céus, quando isso vai terminar?".

Freud, os simbolistas e o Jim Morrison diriam que este último é o melhor deles. Tsc.

sábado, 2 de junho de 2012

O medo da determinação.

Ninguém sabe dizer, com exatidão, o marco do início e do fim das coisas.

Os físicos, matemáticos, astrônomos, poetas, antropólogos, economistas. Todos tentam. Mas como afirmar, com certeza absoluta? Ninguém quer carregar este fardo. Afinal, e se estiverem errados?

Relacionamentos, por exemplo. As pessoas falam de determinados beijos, viagens, declarações, encontros inesperados, ligações no meio da noite, sms ao acaso (mais modernamente). 
Lembro de um filme, da Audrey Tautou. Ela se separa, devido à guerra, do homem que achava ser o amor da sua vida. Ele desaparece, e ela passa o filme todo procurando por ele. E tem momentos, de tanto desespero e saudades, que ela mentalmente conta até 5, e faz um acordo consigo mesma de que, se algo determinado acontecer naquele momento (como um carro passar numa estrada de terra abandonada), quer dizer que ele está vivo, e ela precisa continuar procurando por ele.
Somos assim. Registramos o marco inicial sempre baseados nestes momentos. "Foi aquela mensagem no meio da noite". "Foi aquele beijo roubado no cinema". "Foi aquele encontro inesperado na fila do teatro".

O que me leva a crer que, o marco inicial - sempre delicioso de se lembrar, seja mais fácil de ser "determinado". Falam em Big Ben, em crise do feudalismo, em capitalismo comercial, em sociedades primitivas, em teoria das cordas. Mas ninguém quer falar sobre o fim. A crise do capitalismo é real, mas ninguém cogita o seu fim em si. O que colocar no lugar? 21 de dezembro de 2012 está próximo, mas não vejo ninguém estocando alimentos na esperança de sobreviver. Negamos o fim. Sempre.

Um casal, juntos há uns 5 anos, passava por uma crise. Era dia dos namorados, e os dois, quebrados, não tinham muito dinheiro para presentes. Combinaram, então, de ir ao shopping, e escolherem presentes adequados para a conta bancária de cada um. Ele escolheu um roupão, acima do valor estipulado. Ela, meio ressabiada, pagou. Afinal, ele era "o amor da sua vida". Era só uma crise. Vai passar.
Chegou a vez dela. Procurou, procurou, e achou um óculos de sol. Precisava de um, mas também extrapolava o preço estimado entre eles. Era o mesmo preço do roupão. "Acho que não tem problema, afinal". Pegou o óculos, mostrou para ele, e ele, rapidamente, disse: "Querida, mas este óculos está um pouquinho caro, não está?".

É isso. Não somos preparados para encerrar algumas coisas. Mas após alguns anos de terapia, podemos concluir, com toda a certeza deste mundo, que é difícil colocar pontos finais. Entretanto, conseguimos determiná-los. O óculos foi o início do fim.