domingo, 24 de dezembro de 2006

Dos fatos marcantes.













A primeira recordação que eu tenho do Natal, é um Papai Noel azul, me entregando o que seria depois uma lancheira vermelha, em 1989. Descobri anos depois (como todas as crianças da minha época) que o velhinho de 25 anos era um amigo de meu pai - que casualmente foi meu professor de física no colégio. Coisas da vida, embora eu sempre tenha gostado da matéria (sorte dele).

Quando era criança, pensava que todas as coisas, especialmente as datas marcantes (Páscoa, Dia das Crianças, Natal, entre outras festas que você dá mais importância até os 10 anos) tinham que ter um momento especial. É, algo marcante, como um Papai Noel azul. Podia ser traumático - eu poderia contar o fato na escola, e não ter nenhum amigo até a adolescência. Mas que se danasse (eu era mais impetuosa quando criança, verdade). Eu tinha que ter o tal fato, e Natal era sempre especial. Tinha o melhor de todos os fatos do ano.
Uma tia que confessou ir ao Medieval - o melhor motel de todos os tempos da década de 90 em SP. Um tio que bebia demais e acabava se afogando na piscina. Uma tia histérica que jogava sapatos na cabeça do marido porque este lhe dava o mesmo presente há 4 anos. Coisas assim.

O melhor Natal, de que tenho plena recordação, foi o de 1994. Em uma certa hora, todas os milhares (porque com 10 anos uma família de 20 pessoas é uma multidão) de convidados começam a se degladiar, falar da crise do país, do tetra-campeonato, do parreira, do efé-agá, entre outras coisas que naquela época não me interessavam (e hoje, continuam não me interessando, pelo menos entre os dias 24 e 25 de dezembro).

De repente, percebi que a minha presença não faria diferença alguma (como acontece em certos momentos até hoje) e fui até a piscina. Morávamos em um condomínio fechado, com quadra, parquinho e tudo o mais, quando tudo o mais era mais barato.
Deitei lá, no espaço de tomar sol. Fiquei ali umas três horas. Ninguém deu por falta. Fiquei olhando pro céu, todo estrelado, bem noite de verão.
Foi a primeira impressão de infinito que eu tive na vida.

Achava que quando crescesse, teria que ser Presidente da República, e bolar uma lei para que toda pessoa, uma vez no ano, olhasse para o céu. Para deixar de ser besta.

Até hoje, quando dizem "espírito de Natal", eu acho que tenho conceitos pervetidos.

quinta-feira, 7 de dezembro de 2006

Um pequeno adendo.

Definitivamente há dois grandes prazeres na vida: comer (em todas as suas concepções) e ir ao cinema.
Há tempos eu não retiro algumas horas do meus dias para me deliciar naquelas poltronas gigantes, que te fazem crer que, ao sair dali, tua vida irá se transformar - você vai encontrar o amor da sua vida, vai tocar uma música duca ao fundo, não haverá louças na pia para você lavar quando chegar em casa (sua casa é própria, claro), tão pouco cheques pré-datados para conferir e aporrinhações diversas, afinal, você tem o seu carro e pode sair para qualquer lugar e fugir desses loucos capitalistas que não respeitam o teu momento de felicidade.

No fundo, bem no fundo, você sabe que é tudo ilusão. Mas é a melhor ilusão que você pode ter na vida. Por duas, ou três horas, se tiver sorte.
Ser um filme.
Um filme bão, extraordinário mesmo. Daqueles que as pessoas assistem, e com aquela lagriminha teimosa no olho esquerdo, e garganta seca, dizem: "Pô, sensacional".

Sem filmes em especial. Não tenho repertório cinematográfico para tal.
Encontro-me no estágio "cenas". E tenho 4 opções.

Brilho Eterno de uma mente sem lembranças.
Crédito: roteiro estupendo.











Pela brilhante sensação de pânico do piadista (e se soube depois, dramático), Jim Carrey, ao estar debaixo dos lençóis com a possível mulher de sua vida, e vê-la se lamentar de sua "falta de beleza". Uma lágrima escorre, de desespero, e ela some. Exatamente como ele desejou. Entretanto, naquele momento, só desejava, ao contrário, manter aquela lembrança. Aquela, somente.
Pela agonia, que eu desejo nunca sentir na vida.
(infelizmente, sem ilustração verdadeira)

Casablanca
Crédito: a história, a história e a história, em todos os seus aspectos cinematográficos.









Rick é um homem, e ponto. E a verdadeira desilusão de um homem nunca foi tão bem retratada. Hoje, entretanto, se eu vislumbro a cena, vejo Sam, dedilhando "You must remember this"...
- Sam, peça mais uma.
"A kiss is just a kiss"
- Claro Rick (e um tapinha nas costas).
"A sight is just a sight"
(Abraçam-se)
"The fundamental things aplly"
- Com tantos bares no mundo Sam!
"As time goes by".

Peixe Grande
Crédito: pela metáfora de uma vida inteira.











O poder de parar no tempo, e observar, em detalhes, e do jeito que você sempre imaginou, e de alguma forma viveu, os melhores momentos da tua vida.

Taxi Driver.
Crédito: mais pungente crítica da sociedade americana da década de 70.












Eu escolho "Are you talking to me?", que se soube, anos mais tarde, foi uma cena totalmente improvisada por Robert. Magnífico e assombroso, como todos os momentos em que você se perde de você mesmo, e não se dá conta disso.

Martin Scorsese afirma, entretanto, que a cena mais importante de Taxi Driver é a que Travis Bickle telefona para Betsy tentando marcar um segundo encontro. Na seqüência, a câmera se move para o lado e faz uma panorâmica para um longo corredor vazio, próximo a Bickle - o movimento da câmera sugere que a conversa entre os dois é muito dolorosa e penosa para ser ouvida.

Depois de alguns anos de grandes telas, todos os dias, antes de dormir, rezo pelas almas de caras como Martin.

Mas certamente, em especial, por este cara:
"Eu amo fazer cinema, nunca me cansei disto.E foi isto que me deu um direito de entrada no mundo e na condição humana, e por isso eu serei sempre agradecido".


















E eu também.

Pela memória de Robert Altman.